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Reviews #13

Terça-feira, 29.01.13

Sofia Romualdo

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O projecto Lusitânia preenche uma lacuna existente desde há muito no panorama da ficção especulativa portuguesa (com algumas notáveis excepções, claro): a fantasia e ficção científica inspirada por e inserida num contexto cultural português. É certo e sabido que Portugal tem uma cultura e Histórias ricas em potencial não explorado, pelo que posso desde já dar os parabéns ao Carlos Silva, à Alexandra Rolo e à restante equipa da Lusitânia pelo trabalho desenvolvido, e votos de que o projecto continue.

Em relação ao primeiro número, no geral, gostei, embora tenha alguns pontos negativos a referir. A experiência com o Almanaque Steampunk 2012 fez-me ter uma nova apreciação pelo trabalho editorial - há imensos desafios escondidos e por mais que se tente nunca é possível fazer um trabalho perfeito, pelo que todas as minhas críticas são no sentido de melhorar o trabalho para uma próxima edição. 

Sendo assim, e começando pela capa, gosto da imagem, mas considero-a demasiado escura - algo arriscado, especialmente quando estamos a lidar com impressão digital. O design, no geral, é adequado, mas, tal como outros leitores já mencionaram, alguns dos fundos dificultam a leitura, quer por terem um padrão demasiado chamativo, quer por serem demasiado escuros, perdendo o contraste com o texto. Aconselharia também a indicação do nome do autor no início de todos os contos. No entanto, as ilustrações funcionam bem e gosto do tipo de letra.

Quanto aos contos em si:

"Sonhos Numa Noite de Natal" de Marcelina Leandro: Quem me conhece sabe que adoro sonhos (estou até a trabalhar numa história com esta temática) pelo que gostei imenso deste conto. A ideia é engraçada e está bem trabalhada. Foi das poucas vezes que senti que um conto tinha o tamanho certo para a história que pretendia explorar.

"Vinho Fino" de Inês Montenegro: Um dos contos que mais me agradou. Adorei a ideia dos parasitas e o modo como se alastraram. O ambiente típico das vinhas do Douro foi aqui muito bem utilizado. Espero em breve ler mais trabalhos desta autora.

"Como Portugal foi Salvo pelos Pastéis de Nata" de Catarina Lima: Infelizmente, não fiquei nada impressionada com este conto. A história arrasta-se no início e acelera demasiado num final pouco credível. O mundo tem potencial, mas este conto parece um first draft (os erros e gralhas não ajudam).

"A Guerra do Fogo" de Nuno Almeida: Embora fosse fácil adivinhar quem é a personagem de que o conto trata (retirando um pouco de força à revelação final) o conto é bom e utiliza de forma fantástica uma época da cultura lusitana que, a meu ver, foi ainda muito pouco explorada. Um autor a seguir.

"A Cidade das Luzes" de José Pedro Lopes: A ideia das auras tornadas visíveis e das consequências na sociedade é original e tem potencial. Penso que o conto perdeu um pouco por ter tentado dar uma explicação científica ao fenómeno, o que para mim teve apenas a consequência de lhe retirar credibilidade. O mesmo aconteceu com o enredo que envolveu o ministro e o trio amoroso. Em suma, uma ideia original, um mundo interessante, com potencial para uma história melhor (talvez, quem sabe, em formato de livro).

"A Passagem Uivante" de Pedro Cipriano: Um conto que transmite bem o lado humano da guerra, e a desvalorização da vida e emoções humanas quando tudo o que importa é o poder e o dinheiro. Uma guerra vista pelos olhos de quem a vive de forma mais próxima, e que muitas vezes é também quem a menos compreende (ou melhor compreende a sua futilidade). Um bom trabalho, mas gostaria de ter passado mais algum tempo com as personagens, de modo a fortalecer a empatia emocional que o conto requer.

Carta da Clockwork Portugal: Aqui sou suspeita, admito. Quem não leu o Almanaque Steampunk 2012 provavelmente vai ficar confuso com a inclusão deste texto, que faz a ponte entre as duas publicações (tanto a carta do Almanaque como a deste livro foram escritas pelo André Nóbrega). Só achei que faria mais sentido se tivesse sido colocada no fim do livro, mas é uma questão de preferência pessoal. 

Os meus parabéns à equipa e aos autores por este novo projecto!

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por Pantapuff às 10:46

Reviews #12

Domingo, 27.01.13

Vitor Frazão

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Em baixo terão a minha opinião sobre cada conto, para já basta-me dizer que como um todo a revista tem saldo positivo. É um projecto recente, ainda com muito para evoluir, mas para já conseguiu manter-se maioritariamente fiel ao seu objectivo inicial de publicar história fantásticas que reflectissem a cultura portuguesa. Estas 3 estrelas são 3,8, que é o meu modo de dizer que gostaria de dar-lhe 4 estrelas, só que não posso. Pelo menos ainda não. Embora acredite que chegarão lá. 

“Sonhos numa Noite de Natal” por Marcelina Leandro. Um conto interessante de brizomancia, baseado no paralelo homógrafo entre o doce e fenómeno durante o sono. Mais pesado que outros contos da autora. Embora tenha gostado dos seus contos mais light, fiquei bem impressionado com este registo. 3 Estrelas

“Vinho Fino” por Inês Montenegro. Uma invasão alienígena bem integrada na realidade cultural portuguesa (aliás, o que se esperava da publicação). Nem sequer faltou as clássicas estupidez e coscuvelhice tuga. Boas descrições e com o tamanho ideal. Mais pequeno não teria dado para nada e maior seria inútil. ;) 3,8 Estrelas. 

“Como Portugal foi salvo pelos pastéis de nata” por Catarina Lima. Realmente seque a premissa requerida pela publicação, estando bem inserida na cultura portuguesa. Dito isto, não foi dos que puxou mais, tirando o pedaço do terramoto. Acima de tudo, acho que é grande demais para o conteúdo que apresenta. 2,7 Estrelas. 

"A Guerra do Fogo" por Nuno Almeida. Bom ritmo e bom conteúdo, tendo bem patente o espírito da figura mitológica em que se inspira. Houve apenas um pequeno detalhe que me irritou ligeiramente, o facto de se falar em Império quando na altura Roma ainda era um República. Império só no século seguinte. Fora isso, nada a apontar. 3,5 Estrelas.

“A Cidade das Luzes” por José Pedro Lopes. Ideia base e personagens interessantes, boa apresentação das alterações sociais e culturais resultantes das Luzes. Por outro lado fraca inclusão da história na sociedade portuguesa. Se não nos fosse directamente dito nunca acreditaríamos que a acção ocorre em solo nacional. Fora isso, só houveram duas coisas que me incomodaram. 1º, o Ministro arranjar um método tão tosco para castigar uma ofensa menor ainda vá, há mesquinhez para isso, agora que fosse pessoalmente espreitá-la, escondido numa esquina, não faz grande sentido. 2º, compreendo o porquê daquela solução final para a questão das Luzes, mas acho que está muito mal explicada e saiu um pouco forçada. 3 Estrelas. Não fosse pelos pontos supracitadas daria muito mais. 

“A Passagem Uivante” por Pedro Cipriano. Um conto mediano com um bom final. Não obstante, boas descrições. 3,3 Estrelas.

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por Pantapuff às 22:58

Reviews #11

Sábado, 26.01.13

André Nóbrega

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No dia em que a comprei, li a Lusitânia quase de uma assentada só. Trata-se, no fundo, duma pequena antologia de contos que não só se localizam geograficamente em Portugal como pretendem explorar a mitologia e cultura típicas do país. Na maioria dos casos os contos que a constituem contribuem para a sensação geral de que se está a ler sobre Portugal e os portugueses, se não os reais, pelo menos o país ou o povo que podem ou poderiam ser, dado se tratar de ficção especulativa.

Quanto à edição em geral há algumas coisas que merecem referência. A opção de colocar um padrão de fundo nas páginas de cada conto e que varia de um para outro, de certa forma individualizando cada história, parece-me uma ideia interessante, contribui até para a atmosfera que o conjunto cria, mas em dois casos - "Como Portugal foi salvo pelos Pastéis de Nata" e "A Cidade das Luzes" - o padrão foi demasiado forte ou confuso prejudicando a leitura do texto. Uma outra questão, a melhorar em posteriores edições ou números, foi a existência de erros ortográficos ou de edição, destacando aqui o conto "Como Portugal foi salvo pelos Pastéis de Nata", de todos o único cuja leitura foi afectada significativamente por este facto. Outra situação que me parece de relevo, da qual me parece que muitos trabalhos deste tipo sofrem, é a grande diferença de qualidade entre os vários textos. Não sei se isto se deve à falta de submissões de qualidade, se à vontade de cumprir uma certa deadline, se é somente uma questão de perspectiva e opinião pessoal, mas vejo isto em muitas antologias e revistas.

Quanto aos contos em si, vou tentar fazer-lhes justiça comentando-os individualmente.
"Sonhos Numa Noite de Natal" de Marcelina Leandro é uma história pequena e simples que traz consigo uma ideia muito interessante sobre o mundo dos sonhos e a previsão do futuro que sem dúvida merece ser explorada num texto maior e mais elaborado para atingir o seu potencial.
"Vinho Fino" de Inês Montenegro é na minha opinião o melhor conto desta Lusitânia. O conceito já sobejamente utilizado de alienígenas parasitas tem aqui uma visão refrescante, com uma escrita e um contexto diferentes dos da ficção científica "habitual" e que me deixaram com vontade de ler mais, tanto desta história como da sua autora.
"Como Portugal foi salvo pelos Pastéis de Nata" de Catarina Lima é para mim o pior dos contos incluídos o que não se deve somente aos erros acima referidos, mas essencialmente a uma história que parece forçada e mal desenvolvida. Se a ideia na qual se baseia é interessante: as bruxas a voar nas suas vassouras Portugal fora, uma Hogwarts / Brakebills no Chiado e até um mercado mágico no Martim Moniz, o enredo e a cadência da escrita não envolvem o leitor, pelo que acabei por dar comigo a ler alguns parágrafos "na diagonal".
"A Guerra do Fogo" por Nuno Almeida é um conto de especulação fantástica e histórica - como o próprio nome indica - em simultâneo, que está bastante bem imaginado e escrito e que cumpre à medida as intenções anunciadas da Lusitânia. Como única crítica negativa poderia apontar talvez o desenvolvimento lento da história relativamente ao enredo que traz.
"A Cidade das Luzes" deixou-me algo confuso. É um conto eminentemente visual, que nos pede para visualizar cada cena (perdoem-me o pleonasmo) e fazer um filme imaginado com o enredo que nos é entregue, algo que destaco como a sua melhor característica. Infelizmente o enredo nem sempre consegue manter o interesse, é uma distopia à qual falta mais contexto para se tornar credível e nos fazer esquecer a estranheza de imaginar luzes/cores sair do peito das pessoas em direcção aos céus. Por um lado, a ideia da investigação do tratamento do daltonismo em macacos, ainda que dê alguma explicação, aparentemente assumindo o texto como típica ficção científica, não consegue dar à história toda a verosimilhança que necessitaria. Por outro lado cansa esta comum associação da emoção ao peito, ao coração, aqui referida pela forma como as luzes saem do corpo, ainda por cima em direcção aos céus, que corresponde decerto mais a um problema pessoal do que a falta de qualidade do conto em si.
"A Passagem Uivante" de Pedro Cipriano é uma história breve mas arrepiante que lembra o leitor que por detrás das máquinas de guerra estão pessoas que muitas vezes levam pouco mais que ordens e instinto de sobrevivência, sem saber as reais motivações da sua liderança para arriscar as suas vidas e as dos inimigos naquele momento ou naquela situação. Isto é particularmente verdade dos cidadãos de países sujeitos a sistemas totalitários para os quais a única liberdade, ainda que relativa, pode ser, quando muito, a de escolher a hora da morte.

Lusitânia afigura-se assim um projecto que se distingue por se afirmar português não só na autoria, mas na temática em si, dando oportunidade a vários autores de mostrar o que valem na ficção especulativa curta e na exploração da nossa história, da nossa mitologia, da nossa cultura, no fundo, de parte do que nos dá uma identidade colectiva. Os meus parabéns pela iniciativa e pelo resultado final, fica aqui o meu desejo de que continue, que melhore sempre, e que para a próxima seja maior!

Em jeito de disclaimer devo informar que participei neste número através da Clockwork Portugal que teve a oportunidade de contribuir com um pequeno texto em jeito de referência ao nosso trabalho.

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por Pantapuff às 22:59

Reviews #10

Sexta-feira, 25.01.13

Adeselna

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Sonhos de uma noite de Natal
de Marcelina Leandro

Sonhos de uma noite de Natal, um título que invoca um trocadilho com "A Midsummer Night's Dream" de Shakespeare, traz ao leitor um ambiente confortável com um setting natalício. A confecção dos sonhos para o Natal acarreta um novo significado e a prosa de Marcelina está pejada de magia. O único senão é o ultimo parágrafo um pouco súbdito, mas que não estraga o que veio atrás.

Vinho fino
de Inês Montenegro

Este conto tem a mesma base do anterior. Uma ideia muito bem explorada sobre o vinho do Douro, mas que perde-se um pouco no fim com demasiadas explicações e com uma ultima frase que sabe a pouco. A concepção entre ficção especulativa e a tradição do vinho poderia ter uma finalização melhor.

Como Portugal foi salvo pelos pastéis de nata
de Catarina Lima

Um conto muito, muito fraco. Se a Lusitânia apresenta-nos dois contos bons, este é o contrário dos anteriores. Prosa pouco desenvolvida, com pouco nexo e uma premissa que é atabalhoada. E foi este o conto que me levou a pensar que a equipa da Lusitânia é toda de Lisboa, porque o conto passa-se em Lisboa. Lisboa corre perigo... *ahem com licença alerta caps lock* PORQUE RAIOS É QUE NO TÍTULO TEM PORTUGAL, QUANDO PASSA-SE TUDO EM LISBOA??? É assim tão difícil mudar uma palavra? Como Lisboa foi salva pelos pastéis de nata! Pronto, continua bonito e muito mais accurate do que aquele título! Os dois primeiros parágrafos do conto eram perfeitamente dispensáveis (fazem lembrar uma composição de escola) e lá melhora um pouco quando a bruxa vais comprar a vassoura, mas logo o conto é desviado para o non-sense.

A guerra do fogo
de Nuno Almeida

Este conto deveria ser estudado como: o que não fazer quando se escreve ficção curta. Descrições, muitas descrições e história na última página. O conto é cansativo, desmotivador e só se safou por invocar os Lusitanos, na época onde a Península Ibérica lutava contra Roma. Merecia uma revisão de estrutura, pois o essencial estava lá.

A cidade das luzes
de José Pedro Lopes

Um conto algo longo, com uma premissa futurista interessante. O fim é desinteressante e pedia para algo mais na onda do 1984, do que propriamente um final com uma esperança artificial. A prosa do autor nota-se estar influenciada pelo inglês "Estamos acabados" (we're through) e tem uma outra gralha que saltou mais à vista (falta de verbo). A exploração de um setting cyberpunk seria interessante. Cyberpunk com uma sociedade distópica. A premissa é boa, a exploração, de igual forma, contudo faltou uma finalização que acompanhasse o ritmo do conto.

A passagem uivante
de Pedro Cipriano

Um conto confuso, cujo único traço de tradição portuguesa são as citações de Fernando Pessoa no fim. Pelos vistos estamos em guerra (há a menção de aviões, pelo que penso século XX? Talvez nas províncias ultramarinas? O conto não nos diz). O conto deveria de ser mudado para talvez a batalha de Lys na 1º Guerra Mundial, onde os portugueses embora tivessem sido massacrados, lutaram até ao fim e mostraram bravura.

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por Pantapuff às 23:07

Reviews #9

Quinta-feira, 24.01.13

Catarina

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De todas as histórias (menos a minha) a que achei mais interessante foi "A Cidade das Luzes". Toda a ideia das luzes que saem do peito é bastante curiosa e quiça, um pouco futurista. 
Tenho apenas a salientar que a edição não foi muito bem conseguida, com muitos erros que escaparam e frases mal translineadas que podem cortar um pouco a velocidade de leitura.
No total acho que a revista foi bem elaborada com histórias bastante interessantes e ilustrações também muito boas.
Gostaria de destacar a ilustradora do meu conto, porque efectivamente fez um trabalho divinal com a bruxa Maria Adelaide e com os seus desenhos em vitral. Gostaria de expressar aqui a minha mais sincera gratidão pelo seu fantástico trabalho, para mim, foi sem dúvida a melhor ilustradora da revista.

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por Pantapuff às 19:35

Reviews #8

Quinta-feira, 24.01.13

Pedro Ferreira

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A capa está porreirinha, mas falta uma contextualização: se colocassem um galo de Barcelos, uma caravela, uma imagem estilizada do D. Afonso Henriques ou do Viriato nada disso seria necessário pois são temas recorrentes do nosso património iconográfico, mas abordando uma lenda rebuscada (o que até é uma boa ideia) sem uma contextualização da mesma é o mesmo que dizer que muitos leitores mais distraidos não chegam lá facilmente. O mundo virtual dos blogues não é desculpa para omissões de informação importante.
Poderiam até dedicar uma página à descrição dessa mesma lenda, que seria até mais interessante (e importante) que aquela inteiramente dedicada aos blogues dos autores, cuja informação contida poderia ser colocada no final de cada conto.

Quanto à edição tenho ainda a condenar a falta de referncia ao nome dos autores no inicio de cada texto, sim porque não é nada prático para o leitor ter que avançar páginas só para saber o nome do autor do texto, assim como o trabalho de revisão, pois dizer que foi mau é quase um elogio. Falta de tempo, de paciencia ou de experiencia??? Tudo bem, mas essas coisas devem ser anotadas!!

Convém dizer que ainda me faltam ler dois contos, o que fará da minha critica um tanto incompleta. Mas os que li, por amor de Deus não há por aí quem saiba escrever? Falta densidade, profundidade e caracterização em quase todos, para além de uma escrita muito primária com constante repetição de pronomes pessoais, advérbios e substantivos próprios. As histórias são quase sempre demasiado lineares e previsiveis e os cenários muito mal caracterizados (nem vale a pena dizer quais, porque estão todas mais ao menos ao mesmo baixo nível).
A história "Como Portugal foi Salvo pelos Pastéis de Nata" é sem dúvida a pior que li: para além de todos os defeitos que citei acima, quase me deu vontade de rir pela forma de como uma bruxa de 150 anos toma comportamentos mais próprios de uma pita de liceu a sentir as primeiras experiencias - fazendo-se tolinha face ao rapaz que sempre gostou dela (caramba, cento e quarenta e tal anos a levar tampas deve ser tempo mais que suficiente para desmotivar qualquer um), etc. Uma pessoa com 150 anos haverá de ter nascido na segunda metade do séc. XIX e com certeza terá um enorme rol de histórias para contar: movimentos artisticos e literários do Geração de 70, o Régicidio, a Primeira Républica, as duas guerras mundiais, a Revolução Russa, o Estado Novo, o Pós-25 de Abril, para não falar da enorme mudança de costumes e do crescimento exponencial da cidade de Lisboa que veio a açambarcar a margem sul do Tejo ao longo do séc.XX. Como será possível que a Maria Adelaide não tenha memórias de tudo isto. Será que autora nunca se apercebeu por exemplo que a sua avó faz uso de um vocabulário em parte diferente do nosso e que reage às situações de uma forma muito diferente de uma mulher dos nossos dias? Numa mulher 40 ou 50 anos mais velha essas diferenças seriam muito mais visiveis. Tentar compreender esta realidade também faz parte das competencias de um bom escritor.
No meio de tudo isto há ainda a destacar os diálogos pouco realistas e muito forçados e os personagens superfluos que são a Matilde e o Gonçalo: poderiam ser desenvolvidos e ocupar um lugar importante na história, mas ficam reduzidos a dois espectadores passivos. A linearidade do argumento é contudo o pior.

A história que mais gostei foi "A Guerra do Fogo", talvez porque se insira muito no género do "sword and sorcery" de que eu gosto muito. Contudo, mesmo assim não a considero boa, nem sequer a melhor, apenas a «menos má». A acção e o espaço foram muito mal caracterizados e a dinâmica de analepse funciona um bocado mal, parece quase que o personagem caminha no meio de um éter amorfo(ok fala-nos em pinheiros para tentar transmitir que estamos num bosque português, de facto só faltaria também referir eucaliptos para ser ainda mais descontextualizado, pois os pinheiros são típicos da Europa Central e só se banalizaram pelo território português a partir do séc. XIII - mais de mil anos depois do Viriato). O diálogo entre o pretor romano e o guarda em relação aos prisioneiros é quase anedótico, pois seria sem dúvida senso comum que a venda de escravos era bastante lucrativa neste periodo.

Outra história que também gostei substancialmente, não mais que a anterior devido às minhas preferencias, foi a do «Vinho Fino». De facto não mais de original tem que a transposição para o território português de conceitos velhos da FC, mas é engraçada. Encontrei algumas semelhanças com o filme "The Grapes of Death" de Jean Rollin, mas acredito que seja apenas coincidencia.

De facto, dei duas estrelas ao projecto, apenas porque gostei da ideia de base. A forma como surgiu deixa muito a desejar. Os autores têm falta de vocabulário e de conhecimentos sólidos da história e cultura portuguesa, preferindo reproduzir temáticas vulgarizadas com um aspecto luso do que criar algo novo e os editores mostraram grande inexpriencia a lidar com o assunto. Não quero desmotivar os autores do projecto, quero apenas contribuir para a melhoria da qualidade e sentir-me-ia contente por dar uma cotação mais elevada ao segundo volume da revista.

Bom Trabalho!

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por Pantapuff às 10:48

Reviews #7

Quarta-feira, 23.01.13

Catarina

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Esta publicação tem na sua origem uma premissa bem interessante, a de dar destaque à cultura e mitologia portuguesa como ponto de partida para ficção especulativa. Missão cumprida. Os contos apresentados transmitem no geral uma sensação de "portugalidade", que apenas não me foi tão evidente nos últimos dois contos.

O design está relativamente bem trabalhado. Gosto dos fundos usados para contornar o problema do aborrecido que seria a página em branco, e cada conto está acompanhado por uma ou várias ilustrações adequadas. Adoro a ilustração da capa.

O reparo que tenho a fazer prende-se com a revisão e edição, que poderiam ter sido mais cuidadas. Também me confundiu o facto de os autores virem identificados por vezes no início, por vezes no fim do texto. E a paginação é um tudo-nada estranha, já que a segunda página (e aqui não estou a contar com a capa) está numerada como... 3.

Sonhos numa Noite de Natal, Marcelina Leandro - Curto mas eficaz a transmitir a sua ideia, podia ser mais claro em certas passagens. A ideia de "ler" os sonhos é bem gira, e gostei da reviravolta final.

Vinho Fino, Inês Montenegro - Um bom design na primeira página, em forma de garrafa. A ideia é provocadora, a dos parasitas, e o cenário do Douro é perfeito. Acho que acabou por se tornar o meu favorito do conjunto.

Como Portugal foi Salvo pelos Pastéis de Nata, Catarina Lima - Arrasta-se um pouco na primeira parte, levando demasiado a chegar ao clímax (o terramoto). O gag da miúda a ver a bruxa a voar e o namorado não acreditar é divertido. A noção de os pastéis terem salvo Portugal também. É um dos contos que precisava de mais uma revisão, notei algumas trocas de letras.

A Guerra do Fogo, Nuno Almeida - A efabulação em torno da figura histórica cria um conto cativante. Pelo título não estava a ver qual o acontecimento focado, mas a figura histórica em questão foi fácil de adivinhar. Tem um ritmo lento, mas funciona bem com este conto.

A Cidade das Luzes, José Pedro Lopes - Este conto precisava de ser melhor editado, algumas frases soaram-me estranhas, as revelações à volta das luzes tendem para info-dump mal feito, e a relação entre Débora e Ivo podia ser mais trabalhada. Mas a ideia base é fabulosa, aquilo que as luzes significam e como isso foi a base para estabelecer um governo autoritário e uma sociedade apática.

A Passagem Uivante, Pedro Cipriano - Tem um final e uma mensagem fortes, mas é curto, não dá tempo para nos ligarmos ao personagem principal ou para compreendermos este mundo.

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por Pantapuff às 15:49

Reviews #6

Terça-feira, 22.01.13

Artur Coelho

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Mais uma boa surpresa, surgida num momento de grande vitalidade no panorama nacional de Ficção Científica e Fantástico. A revista Lusitânia foge às etiquetas posicionando-se como de ficção especulativa e surpreende pela sua frescura de juventude, apostando em novos autores sem se socorrer da ancoragem em nomes já consagrados. 

O tom da literatura fantástica é dado no arranque com o contoSonhos de uma Noite de Natal onde Marcelina Leandro mistura ambientes tradicionais do género com premonições e tempo não linear. Subtis invasões alienígenas contaminam a humanidade através do vinho do porto em Vinho Fino de Inês Montenegro. Segue-se Catarina Lima, tongue in cheek a recordar certas afirmações recentes de alguns políticos, num Como Portugal Foi Salvo Pelos Pastéis de Nata misturando cataclismos lisboetas e a estética da bruxaria benfazeja que se remete mais para a fantasia do que para o horror. Uma prosa mais rebuscada, fortemente dentro do gótico literário, é o que nos reserva a reinvenção do mito de Viriato por Nuno Almeida em A Guerra do Fogo

A Cidade das Luzes intriga pelo seu conceito, para mim fortemente reminiscente da emergência contemporânea de uma sociedade panopticon potenciada pela tecnologia, onde os perfis digitais de cada um colidem com uma ideia de privacidade em desaparecimento. Neste conto são luzes que mostram e condicionam estados de alma. O retrato de uma sociedade totalitária assente no controle emocional é outra das vertentes interessantes deste conto. A prosa de José Pedro Lopes, com clareza descritiva mas com problemas de interligação dos diferentes momentos narrativos dificulta a compreensão deste texto que parte de premissas intrigantes. Pedro Cipriano termina com um sólido futuro ficcional em A Passagem Uivante, conto em que vai revelando vistas progressivamente mais abrangentes de um futuro distópico inspirado no passado histórico.

Vozes novas, frescas, com ideias interessantes é o que nos reserva este primeiro número da Lusitânia.

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por Pantapuff às 20:52

Reviews #5

Terça-feira, 22.01.13

Cláudia P.

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Lusitânia é uma revista, e talvez não fizesse muito sentido ser comentada no GoodReads, senão fosse o seu conceito e o projecto que a originou. É uma colectânea (de pequena dimensão, entenda-se) de contos de ficcção, muitos deles de mãos dadas com o género fantástico, e que remetem para a cultura portuguesa, ou não fosse o seu nome apelar à alma lusitana. 

Sendo um projecto novo, tenho a elogiar as ilustrações e a concepção da revista. Não houve uma que não gostasse e a estética tornou-a bastante apelativa, vejam só a capa!

Por outro lado, deveria ter havido um maior cuidado na revisão, já que os processos de translineação demarcados erradamente são gritantes e tornavam a leitura aborrecida por vezes.

Depois, e não desmerecendo a qualidade dos contos, sente-se uma ligeira tendência numa direcção, que a inserção de três contos que não achei estarem dentro do mesmo estilo ficam algo despropositados. Se a ideia era torná-la o mais diversificada possível, teria optado por uma escolha mais intencional. Ainda assim, a qualidade dos contos é bastante elevada e como tal, também não quereria ser eu a deixar um de fora.

De todos, os meus preferidos foram:

Sonhos numa noite de Natal,de Marcelina Leandro - Lembra-me o exotismo familiar criado em livros de Isabel Allende, que junta o misticismo ao amor e à gastronomia. Laços familiares desvendados pelas brumas da adivinhação, com um ligeiro adoçante de Natal.

Como Portugal foi salvo pelos Pastéis de Nata, de Catarina Lima - Relembra-me os meus tempos de literatura mais juvenil, para além de criar um sentimento de localização, ao passar-se na nossa Moderna Lisboa, fazendo-nos respirar a cidade ao mesmo tempo que Maria Adelaide remunga sobre invasões de pombos.

A Guerra do Fogo, Nuno Almeida - É ligeiramenre pesado para a época do Natal e as minhas restantes literatuas correntes, mas o estilo de escrita, corrente e vertiginoso é exactamente aquele que gosto de ler. É sem dúvida o retumbar da paixão lusitana aos ombros de uma figura mítica, e que já deu aso a tantas outras histórias.

A Cidade das Luzes,de José Pedro Lopes - Pela imaginação e conceito inesperado, e porque numa altura em que as distopias estão em voga, daria um bom livro se fosse explorado aprofundadamente.

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por Pantapuff às 17:43

Reviews #4

Segunda-feira, 21.01.13

Joel Gomes

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Adquirido no dia do seu lançamento, este primeiro volume da Lusitânia foi uma boa companhia nas viagens de hoje. Achei que os contos estavam todos bons, com destaque em particular para 'Vinho Fino', 'Como Portugal foi salvo pelos Pastéis de Nata' e 'A Cidade das Luzes'. Os problemas de edição que já foram apontados por terceiros não me perturbaram a leitura, mas é preciso mais atenção para a próxima. Eu consigo abstrair-me de gralhas desse género e focar-me nas histórias, só que há quem não consiga e isso é mau tanto para os autores como para os responsáveis da Lusitânia.

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por Pantapuff às 23:03


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